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Mulheres do Marajó destacam força empreendedora em roda de conversa da Casa Pará

Encontro do Açaí Talks, na COP30, reuniu representantes da moda, da produção artesanal e do setor leiteiro paraenses
Por Da Redação
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A última roda de conversa da Casa Pará, espaço que compôs a En-Zone, a Zona do Empreendedorismo do Sebrae no Pará durante a COP30, instalada no Porto Futuro I, reuniu três mulheres marajoaras de trajetória inspiradora para contar um pouco de suas histórias e mostrar que é possível transformar desafios em impulso e sonhos em realidade. O Açai Talks recebeu, na noite desta sexta-feira (21), Rosilda Angelim, criadora da marca Canybó; Milene Tavares, artesã e integrante do grupo Tambores do Pacoval, e Gabriela Gouveia, gestora da Fazenda Mironga e presidente da Associação dos Produtores de Leite e Queijo do Marajó (APLQMARAJO), e Noanny Maia, CEO da marca Cacauaré.

Gabriela foi a primeira a falar de sua caminhada à frente da administração da Fazenda Mironga, onde a família tem uma propriedade voltada à criação de búfalos. “Temos uma relação com esse animal muito intensa, e a proposta da Mironga sempre foi fazer com que as pessoas pudessem ter essa mesma relação, que vai muito além de uma foto com ele para guardar de lembrança da Ilha do Marajó. Sou a quarta geração de uma família que descende de vaqueiros marajoaras. De muito tempo já tínhamos a percepção de que o búfalo é um animal dócil, mas só faz o que quer. E foi partindo desse entendimento que construímos essa relação, de dar ao búfalo o que ele precisa para que a gente possa usar dele o que for possível” contou, destacando o tripé que direciona o empreendimento: ecologicamente correto, socialmente justo e economicamente viável.

“Partindo do princípio que se essa búfala viver bem, tudo que vier dela também é bom. Com uma boa búfala se faz um bom leite e um bom queijo. Lá em casa a gente produz o queijo do Marajó, que é o único produto lácteo genuinamente paraense, e cuja receita a gente reproduz há muitos anos. Então tem uma carga cultural ancestral de mais de 250 anos no modo de fazer esse queijo”, ressalta. O produto recebeu do INPI o registro de indicação geográfica, conferido a produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, o que lhes atribui reputação, valor intrínseco e identidade própria.

Moda

Nascida na comunidade de Quilombo do Bairro Alto, no município de Salvaterra, Rosilda Angelim migrou para Soure aos cinco anos e lá escreveu a sua história. Encontrou na costura a saída para uma crise financeira que se abateu sobre a família após deixar um trabalho na prefeitura municipal e sair como ela mesma diz “com uma mão na frente e outra atrás”. Eu entrei numa depressão e tive que sair dela na marra, porque tinha família, dois filhos e precisava ajudar meu marido a cuidar deles. Foi então que mergulhei de cabeça na costura, que já era algo que minha mãe, costureira de alfaiataria, fazia. Mas, diferente dela, parti para confecção. Eu já conhecia o grafismo Marajoara e um dia, do nada, pensei: que tal se eu colocar grafismo nas peças que eu faço. Foi assim que comecei fazer roupas e produzir bolsas”, contou.

O processo até a ascensão foi doloroso, relatou. “Mas também aprendi que sozinha eu não ia acontecer, não ia fluir que eu precisava que outras mulheres seguissem comigo. Dez anos atrás, eu ainda dando muita topada, apareceu na minha vida o Sebrae Pará”, recorda. O curso, com duração de dois anos, começou com 44 mulheres e terminou com 63. Hoje, todas trabalham com o grafismo marajoara aplicado à moda.

Noanny Maia falou dos desafios que precisou superar para retomar a cultura do cacau em Mocajuba. Foto: Selton Martins.

Pioneira na moda marajoara, ela integra o Polo de Moda Marajó, gerenciado pelo Sebrae Pará, ao lado de outras mulheres. “Ser uma preta na moda é difícil, mas, depois que você se autoidentifica e sabe falar, sabe passar para as pessoas o que você quer, com a tua origem e a ancestralidade que pulsa na tua veia, você sabe que está no caminho certo”, aconselhou.

“Sou uma empreendedora que vivia uma trilha de capacitações dentro do Sebrae. E tenho muito orgulho de falar isso, porque as habilidades que me permitiram liderar um negócio foram modeladas pelo Sebrae e eu sou muito grata a todos os acertos que ele me permite ainda hoje”, destaca Noanny Maia, CEO da Cacauaré.

Quando teve seu primeiro filho, Milene Tavares decidiu que precisava ter uma fonte de renda para não depender dos pais e apostou tudo no carimbó. “O Tamborim do Pacoval foi uma vitrine para mim, e eu digo que até hoje eu tô tendo oportunidades incríveis graças ao grupo. Certa vez me perguntaram como que eu tinha coragem de fazer um tambor de macumba. E eu respondi: Isso que eu tô fazendo aqui é um instrumento sagrado, e não é porque saiu das minhas mãos. Aquele simples tronco de árvore tem toda uma história por trás. Poder pegar e trabalhar aquela peça para deixar o mais impecável possível é gratificante, porque a gente não pode simplesmente chegar na mata, sem pedir licença ou permissão”, defende.

Milene contou que fez seu primeiro curimbó no pátio da casa dos pais sem a certeza de que aquilo daria certo. “Botei todo o amor e carinho naquela peça e comecei a divulgar. Vi que deu certo e compraram. Isso me deixou muito feliz porque era uma peça minha, feita manualmente. Comecei a produzir mais e mais, e hoje eu trabalho com isso e afirmo: eu vivo do meu trabalho, vivo da minha produção e da minha arte. E eu digo que o Marajó é sagrado para mim.”Para Milene, é indispensável repassar o que se aprende. “A nossa ancestralidade é forte, e não só na batida do carimbó, é também na confecção da roupa, na produção do queijo. Então, a gente tem que repassar isso e não deixar que legado morrer.”

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